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Bloco de Notas



Aqui é comum

Escaldar pensamentos


Corpos em fervura

Executam passos de

Dança


A procura do lado da sombra



Entre pele e

pretexto

a

sutileza do afeto


(Texto do livro "O buraco e outras histórias", escrito entre 2012-2013)


Nem parece que o comprei hoje.

Estava tão feliz. Quando olhei na loja pela manhã, imediatamente me imaginei naquele porta-retrato.

Era lindo, vivo, com uma libélula colorida no canto. Ao centro, a foto de um casal. Assim que eu chegasse em casa, substituiria.

Ainda lembro como abri o pacote com rapidez quando cheguei e procurei uma foto nossa. Não havia ali nenhuma suficientemente boa.

Então, talvez na manhã seguinte eu revelasse alguma daquelas bem felizes, que animam ou fazem inveja a quem olha.

Coloquei na mesinha do quarto em frente à cama e fui me preparar para a noite linda que viria.

Agora madrugada.

Com os olhos molhados na cama eu posso ver o porta-retrato.

Anatomicamente não faz sentido esse peso no peito.

É como se todos os meus órgãos internos estivessem sendo destruídos lentamente, à medida que vem cada pensamento.

Aquele casal, ali, alheio.

Aquele casal que eu desdenhei pela minha vantagem sobre eles em ser real.

Nitidamente eles eram os melhores.

Sorriam sempre.

Sempre perto um do outro.

Certamente não se desentendiam.

Ele não apertava com força o rosto dela quando estava irritado, nem o braço chegando a machucar.

Ele não gritava com ela, chamando-a de puta, vadia ou qualquer outro nome escroto.

Ele não a empurrava no chão, fazendo-a cair, a qualquer hora e em qualquer lugar.

Que louca eu fui quando quis substituir aquele casal do porta-retrato por nós dois.


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